sexta-feira, 27 de julho de 2018

Ninguém deveria trabalhar só por paixão


Paixão não remunerada mata de fome. Se não você, que tem alguém te sustentando em casa pra fazer trabalho voluntário, mata o outro, que estudou pra fazer a mesma coisa e não consegue achar quem pague, porque tem gente fazendo de graça.
Estamos cada vez mais acostumados ao entretenimento exploratório. Assisto, depois decido se pago; consumo, critico e decido se vale minha moeda. Isso quando não me encho de shows, exposições, filmes e peças de teatro e depois chamo de vagabundo quem estuda artes; consumo conteúdo cultural de graça, critico quem não tem o mesmo repertório e apoio corte de verbas para a cultura.
Milhões de artistas acham que se fizerem as coisas de graça um dia vão ser reconhecidos; que se derem algumas demonstrações, vai chegar o dia em que vão ser bem pagos. Só que o mundo da arte, assim como muitos, depende muito de quem são seus contatos, mais do que como é o seu talento.
Quem trabalha de graça “por paixão” destrói a própria categoria. Quem tem um pouquinho de visão sistêmica e amor pelo que faz, se mobiliza para valorizar a própria atividade e fazer com que os outros também valorizem.

segunda-feira, 9 de julho de 2018

Clientes monstros


Todo mundo tem clientes monstros. O que muita gente não sabe é que o monstro está mais na sua cabeça do que no cliente. Explico: quando precisamos entregar um produto ou serviço a alguém, é grande a chance de ficarmos intimidados. “Será que o cliente vai gostar?” “Será que vai falar mal de mim?” “Será que era isso mesmo que ele queria?” A falta de respostas claras a essas dúvidas pode fazer com que desenhemos um monstro na nossa cabeça e comecemos a brigar com ele sem nem saber se ele é real. Dica para lutar contra ele? Pergunte.
Antes de assumir que o cliente tem que gostar do que você está fazendo, pergunte se é isso mesmo que ele gostaria. “Ah, mas eu estou fazendo um relatório súper bem detalhado, com ótimas ideias que ele tem que entender!”. Tem mesmo? Se a ideia do seu cliente é ler diversos relatórios no período de meia hora para ter uma noção geral de tudo o que se passa em diferentes setores, um relatório detalhado demais não vai ser satisfatório e você vai se sentir frustrado por ter se esforçado tanto nisso. Uma simples pergunta pode resolver, como “você precisa de um relatório detalhado ou de uma visão geral?” E se a resposta não for a que você queria, tente entender que cada um tem as suas necessidades. De qualquer jeito, é sempre melhor perguntar antes de se frustrar.
“Ah, mas eu perguntei se não seria melhor contratarmos a empresa mais barata e ele concordou.” Aqui entra a completude da pergunta. Ao falar com o cliente você mostrou para ele tudo o que estava em jogo para a decisão ou só o que você achava importante? Falar sobre o preço das empresas é relevante, mas se a tal empresa mais barata tem alta rejeição de resultados, é importante também destacar isso. Se é o cliente quem está decidindo, dê elementos para que ele decida. Uma boa forma de consultá-lo, nesse caso, seria: “A empresa X é a maia barata de todas, no entanto ela tem alto índice de rejeição. A empresa Y é melhor avaliada, mas é mais cara.” Pronto. Você deu as informações que tinha e deixou que ele assuma a responsabilidade pelos riscos da decisão que decidiu tomar.
Algo que todo mundo sabe desde criancinha, mas de vez em quando esquece: educação. Em um mundo de redes sociais, fóruns e debates acalorados, todo mundo sabe como passar uma indireta ou dar uma cutucada com o tom da frase, as palavras colocadas no meio dela, os adjetivos. Mesmo os e-mails mais polidos podem ser ofensivos, se não soubermos usar o tom adequado. Pergunte-se: vale a pena comprar uma briga no seu trabalho quando você poderia simplesmente ser produtivo e ir para a casa com sensação de dever cumprido? Em nome de quê? Se for só do seu ego, talvez seja melhor procurar uma terapia, do que sarna pra se coçar.
“Ah, mas ele me mandou um e-mail provocativo”. Sim, isso acontece muito. A questão é se vale a pena dar sequência a um ciclo de provocações ou tentar ser melhor do que isso e transformar a comunicação em algo civilizado e saudável para o psicológico de todo mundo. Às vezes vale mesmo a pena deixar os e-mails de lado e tentar melhorar o clima com o cliente pessoalmente ou por telefone, com sincera intenção de harmonizar a relação. Mas tente ser sincero quanto à forma como você está se sentindo, mais do que apontar problemas no que o outro fez. Diga “eu fiquei preocupado com as coisas que você disse” em vez de “você não deveria ter escrito aquilo”. Tente mostrar como é importante, para você, ter uma interação madura.
Maturidade é um remédio que demora pra funcionar, mas pode matar muitos monstros.

quinta-feira, 22 de março de 2018

Democratização x banalização


O problema de um monte de gente publicar na internet artigos didáticos sobre aquilo que não entende direito não é nem estudar errado. Quando a gente realmente estuda um assunto, a gente percebe os charlatões e foge de alguns sites. O que eu estou notando, no entanto, é que muitos selecionadores de empresas e de concursos não percebem. Pescam assuntos em páginas quaisquer e usam para fazer processo seletivo de má qualidade. Nunca antes tive que abrir tantos recursos de concurso por questões mal feitas ou escancaradamente erradas, que parecem ser fruto de colagens de sites de má qualidade. Imagino quantos processos seletivos descartam bons profissionais porque o próprio recrutamento não é feito com cuidado. 


domingo, 18 de fevereiro de 2018

Passaporte especial

A leitura pode ser um hábito, pode ser uma obrigação ou pode ser um jeito de fugir por alguns instantes para uma realidade paralela. Nas ficções, a gente mergulha no tempo do autor, acredita nas descrições que ele faz e de repente está rodeado por lugares, pessoas e coisas que não existem no nosso dia a dia.  Ao ler artigos acadêmicos, não é difícil começar a discutir mentalmente com o autor, discordando, aplaudindo ou apenas reconhecendo a beleza do raciocínio feito. Em biografias, temos a oportunidade de conhecer alguém, de assistir suas vivências e de acompanhar o impacto dos acontecimentos sobre sua vida e seus pensamentos. De um jeito ou de outro, bons livros nos tiram do momento presente para colocar em contato com outra realidade, que pode apenas nos divertir ou também impactar o mundo em que vivemos.
Toda essa riqueza, no entanto, tem um portal: saber ler. Não apenas espiar as manchetes de notícias ou artigos de internet, mas desafiar-se a ler uma escrita muitas vezes ultrapassada, muitas vezes mais rebuscada do que mastigada para o público. Quem se lembra das aulas de interpretação de texto sabe do que eu estou falando. Nesses exercícios, abrimos mão da interpretação livre para tentar decifrar o que o autor está querendo expor. Nesses exercícios nos tornamos capazes de atravessar uma ponte entre o nosso ponto de vista e o do outro, mesmo que esse outro esteja distante ou mesmo morto.
A leitura de autores como Bourdieu, Guimarães Rosa ou mesmo Machado de Assis pode ser uma verdadeira tortura para quem não se propõe a encarar diferentes estilos. Se por preguiça de aprender a ler bem deixarmos de ler esses autores, fechamos as portas para mundos que têm muito a oferecer. E o fato é que só aprendemos bem uma língua que usamos. Assim, por mais que tenhamos licença para usar uma linguagem preguiçosa em diversos momentos, se nos entregarmos exclusivamente a ela podemos nos afastar totalmente de universos mais complexos, que exigem um pouco mais, mas que guardam belezas ausentes alhures.
Quando negamos o desenvolvimento dessa habilidade, ficamos restritos à mediocridade cotidiana, apenas àquilo a que a linguagem simples satisfaz, ao lugar-comum. O uso das letras como mera extensão do mundo vivido, do mundo corrido sem beleza poética ou reflexão crítica é útil, porque é rápido e serve a propósitos simples. Mas quem quer ir além do mundo concreto, quem quer viajar em outros cenários, discutir com grandes mentes e permitir que os neurônios respirem um ar diferente de vez em quando tem que aprender a percorrer os caminhos que levam a outras realidades.

É possível viajar o mundo com um passaporte comum, tempo e dinheiro suficientes. É possível viajar muitos mundos aprendendo a ler diferentes linguagens. 

segunda-feira, 3 de julho de 2017

As múltiplas relações de um escritor

Você já parou pra pensar quanto tempo um escritor levou para escrever um livro que você levou semanas para ler? Alguns levam meses, outros anos mexendo e remexendo no mesmo livro. Geralmente, um escritor ainda precisa lapidar, revisar, reescrever o que não ficou tão bom assim… Ou seja: ele não só passou muito tempo lidando com o mesmo texto, como ele passou muito tempo lidando com uma versão pior do que a que foi publicada.
Muitos leitores e especialmente escritores têm a impressão de que para poder falar que o livro é bom, o autor precisa amar profundamente todas as personagens, admirando suas qualidades e defeitos e jamais se enjoar delas – o que é uma ilusão.
Tem personagens que eu adoro, como se fossem pessoas vivas, minhas conhecidas. Isso não quer dizer que eu sempre tenha paciência com elas ou que queira vê-las todo dia. Às vezes preciso me afastar um pouquinho, dar um tempo na relação para que não fique um relacionamento excessivo. E às vezes eu canso delas também, tenho preguiça de voltar a escrever a sua história porque simplesmente eu lidei mais com elas do que gostaria.
Isso quer dizer que o livro ou as personagens são ruins? De jeito nenhum! Algumas coisas são lindas, mas não tanto a ponto de serem idolatradas todos os dias. Por fim, acontece muito o fenômeno oposto ao do autor que quer se promover sem fim e alega idolatrar todos os dias o próprio livro: o da rejeição. Eu já passei por isso e conheço outros que passaram: justamente por achar que um autor deve adorar tanto o próprio livro a ponto de nunca se cansar dele, muitos autores, quando se cansam, acham que o livro está ruim e o abandonam como uma obra mal feita.

Quer uma dica? Se você escreveu, lapidou, se dedicou e chegou, em algum momento a amar o trabalho que fez, não exija tanto do resultado final. Tem uma hora que a gente tem que deixar o julgamento aos leitores. 

quarta-feira, 21 de junho de 2017

Como receber críticas

Eu não gosto de receber críticas. Acho importante, mas não sou masoquista. É muito mais gostoso receber elogios exagerados do que críticas sinceras. Se fosse fazer uma metáfora, seria como comer verduras em vez de encher a cara de brigadeiro. A primeira opção não é a mais agradável, mas é a que te faz mais bem, a longo prazo.
 Para enfrentar essa difícil tarefa, no entanto, existem algumas astúcias. Primeiro, procurar quem vai fazer uma boa crítica. Uma boa crítica, a meu ver, aponta o que precisa ser apontado sem ofender. Escancara para você tudo o que precisa ser mudado no seu trabalho, mas jamais conta suas faltas para os seus amigos em conversas de corredor. Um bom crítico respeita e tem coragem para ser sincero.
Outra astúcia é perceber o nível da crítica. Se você escreveu um texto e as críticas vão desde o nível mais básico, como gramática, clareza ou coesão do texto, tem que ter humildade e estudar mais português. Se as críticas estão no conteúdo, na linha de raciocínio e em aspectos mais literários, veja o lado bom da coisa: escrever você já sabe, só precisa aprimorar a técnica para se tornar um bom escritor.
Não acho que nenhuma crítica deva ser ignorada, mas devemos analisar o tipo de crítica e decidir como nos posicionar diante dela. Tem crítica que é senso comum, técnica, dica publicitária. Tem crítica que tem mais a ver com o posicionamento pessoal de quem criticou. Se eu escrever uma história com personagens homossexuais e meu crítico achar que eu devo tirar isso porque vai contra os valores conservadores, que importância eu vou dar? A importância de saber que meu texto incomoda homofóbicos, o que não é um ponto negativo só porque o meu leitor achou que era.

Por fim, é preciso aprender a lidar com sentimentos. Depois de receber críticas, mesmo que sejam muito bem fundamentadas, pode bater um desânimo e você começar a achar que não nasceu pra isso. Eu acho que todo mundo nasceu pra crescer e aprender. Saber dar um tempo, olhar o texto depois pra reescrever e mesmo dar-se conta de quanta coisa boa recebe críticas pode ajudar a lidar com esse baque inicial. Não acho que ninguém deveria desistir por ele, mas aprender a lidar e seguir em frente. 

quinta-feira, 1 de setembro de 2016

O sol de Marselha

Depois de publicar duas vezes por editora, resolvi me aventurar na autopublicação.
O livro não tem versão impressa, mas é fácil de adquirir e de ler em computador, kindle, tablet ou outras plataformas.
A principal razão: é mais barato, para mim e para o leitor.
Sei que por trás da publicação em editora tem muito trabalho que precisa ser pago, e que por isso o livro sai mais caro, tendo também custo, mesmo que reduzido, ao autor. Não desprezo a importância do trabalho que é feito. Mas a verdade é que eu não tenho condições de ficar pagando para publicar. O pouco retorno que tenho com os livros ainda tem que ser discutido com a editora quando ela “esquece” de pagar os royalties. Isso antes do livro ser pirateado e distribuído gratuitamente, como também aconteceu.
Então é isso. Livro novo, dessa vez direto na Amazon, sobre as minhas experiências na França: